CAPÍTULO 3

entre olhares

A ARTE, O HUMANO E O REFLEXO DO QUE SE VÊ

Qual é a sua obra preferida?

Sempre me perguntam qual é a minha obra favorita. E, com carinho, respondo: nenhuma em especial — ou talvez todas. O que me toca não é uma imagem, mas o que está por trás dela. O que me marca é a coragem.

Cada mulher que chega até mim traz mais do que um corpo: ela traz sua história. Suas dores, seus silêncios, desejos, memórias. É essa entrega que move tudo o que faço. Porque antes de pintar, eu escuto. E escutar, de verdade, é mergulhar no que o outro vive, sem pressa nem julgamento.

Essa escuta se encontra com tudo o que sou: a mulher que cresceu entre tintas e afetos, filha de um artista sensível, formada em Artes Visuais e Publicidade, alguém que respira estética como linguagem de mundo. Quando essa história me atravessa, nasce uma obra — uma criação que é nossa. O reflexo de um encontro entre o que foi vivido e o que foi sentido.

A arte como espelho da alma

A arte é como a gente: múltipla, imprevisível, profunda. O que você vê numa obra diz tanto sobre você quanto sobre quem a criou. Quando uma mulher compartilha sua história comigo, algo precioso acontece: ela me convida a enxergar o mundo com seus olhos, e eu a recebo com os meus. É nesse espaço de confiança que a criação acontece.

Não sou apenas alguém que registra. Sou alguém que sente junto. Entre o que ela diz e o que eu percebo, nasce uma nova possibilidade de olhar. A obra é resultado desse entrelaçar de mundos. Cada detalhe pulsa com alma.

A coragem de se revelar

O que mais me emociona em cada ensaio não é a estética ou a técnica. É a coragem. A coragem de uma mulher que se entrega de peito aberto, permitindo ser vista de um jeito novo — sem armaduras, sem máscaras.

Cada uma delas carrega dentro de si um universo. E ao se revelar, é como se abrisse janelas de uma casa antiga, permitindo que a luz toque lugares antes esquecidos. Esse gesto íntimo é um ato de bravura. De confiança. De amor.

Sou o espelho que escuta. O canal por onde a história se transforma em imagem, em cor, em expressão. A mulher que se revela diante de mim floresce. E essa transformação silenciosa é o que me faz continuar.

Cada obra nasce de duas verdades: a dela, ao se abrir; e a minha, ao escutar com presença.

Sensibilidade como potência

Desde criança, vivi cercada de arte. Era como respirar cor, forma e silêncio. Mais do que ver, aprendi a sentir. Mais do que criar, aprendi a ouvir.

Minha formação em Artes Visuais e Publicidade refinou esse olhar. A intuição encontrou linguagem, o sentir ganhou direção. Hoje, quando recebo alguém em meu estúdio, não é apenas o meu saber técnico que fala — é a minha escuta viva, a minha história, a minha capacidade de conexão.

Traduzir a verdade de alguém em imagem é um trabalho delicado, que exige mais do que habilidade: exige presença, entrega e um profundo respeito pela história do outro. Minha missão é dar forma ao invisível, revelar a beleza que já existe, mas que, às vezes, precisa ser vista com novos olhos.

A obra também é sua

Se você chegou até aqui, talvez tenha sentido algo. Talvez uma imagem tenha lhe tocado, ou uma palavra tenha acendido uma memória. Isso, mais do que falar sobre mim, diz muito sobre você.

A arte tem esse poder misterioso de tocar o que está dentro. Ela não explica — ela revela. Uma obra é mais do que imagem. É um espelho. Quando você se emociona diante de algo que criei, está, na verdade, se reconhecendo. E é nesse instante que a obra deixa de ser só minha e passa a ser também sua.

Quando a criação se torna encontro

Lembro de uma mulher que, ao final do ensaio, disse: “Nunca me senti tão poderosa.” Aquilo me atravessou. Porque não era sobre beleza. Era sobre libertação. Sobre se ver com novos olhos. Sobre se reconhecer.

É por isso que continuo criando. Porque, quando consigo proporcionar um momento de felicidade genuína para alguém, sinto que estou cumprindo o meu propósito. Não há poder maior do que fazer algo positivo por alguém — com verdade e com amor.

Essa é a força que me move: transformar escuta em arte, presença em imagem, emoção em beleza.

A obra continua

Algumas das fotografias que acompanham este texto fazem parte da minha primeira exposição, em 2017. Eu tinha 36 anos — e foram 36 obras, cada uma representando um fragmento do meu caminho até ali. Na abertura, vivi algo especial: deixei que o público pintasse sobre mim, transformando meu corpo em tela. Um gesto de troca, vulnerabilidade e abertura.

Foi uma forma de dizer que a arte não está apenas no que crio, mas naquilo que compartilho. Que a experiência estética também pode ser coletiva. E que cada pessoa que se permite sentir se torna, de algum modo, coautora.

A minha obra preferida?

Sempre será a próxima. Porque cada novo encontro carrega o potencial de revelar o que ainda não foi visto — e de curar o que precisa ser acolhido.

Criar, para mim, é estar viva. É tocar e ser tocada. É transformar histórias em imagens que, quem sabe, possam ser uma janela para o que há de mais bonito em nós.

CHAPTER 3

between glances

ART, THE HUMAN AND THE REFLECTION OF WHAT IS SEEN

What is your favorite work?

I'm always asked what my favorite work is. And, with affection, I answer: none in particular - or perhaps all of them. What touches me is not an image, but what lies behind it. What marks me out is courage.

Each woman who comes to me brings more than a body: she brings her story. Her pain, her silences, her desires, her memories. It's this surrender that drives everything I do. Because before I paint, I listen. And to really listen is to immerse myself in what the other person is experiencing, without haste or judgment.

This listening meets everything I am: a woman who grew up among paints and affections, the daughter of a sensitive artist, a graduate in Visual Arts and Advertising, someone who breathes aesthetics as a language of the world. When this story crosses my path, a work is born - a creation that is ours. The reflection of an encounter between what was experienced and what was felt.

Art as a mirror of the soul

Art is like us: multiple, unpredictable, profound. What you see in a work says as much about you as it does about the person who created it. When a woman shares her story with me, something precious happens: she invites me to see the world through her eyes, and I welcome her with mine. It is in this space of trust that creation takes place.

I'm not just someone who records. I'm someone who feels together. Between what she says and what I perceive, a new way of looking is born. The work is the result of this interweaving of worlds. Every detail pulses with soul.

The courage to reveal oneself

What excites me most about each shoot is not the aesthetics or the technique. It's the courage. The courage of a woman who gives herself openly, allowing herself to be seen in a new way - without armor, without masks.

Each of them carries a universe within them. And when she reveals herself, it's as if she's opening windows in an old house, allowing the light to touch places that were previously forgotten. This intimate gesture is an act of bravery. Of trust. Of love.

I am the mirror that listens. The channel through which the story is transformed into an image, into color, into expression. The woman who reveals herself to me blossoms. And this silent transformation is what keeps me going.

Each work is born from two truths: hers, when she opens up; and mine, when I listen with presence.

Sensitivity as power

Ever since I was a child, I was surrounded by art. It was like breathing in color, form and silence. More than seeing, I learned to feel. More than creating, I learned to listen.

My training in Visual Arts and Advertising refined this outlook. Intuition found language, feeling gained direction. Today, when I welcome someone into my studio, it's not just my technical knowledge that speaks - it's my living listening, my story, my ability to connect.

Translating someone's truth into an image is a delicate job that requires more than skill: it requires presence, commitment and a deep respect for the other person's story. My mission is to give form to the invisible, to reveal the beauty that already exists, but which sometimes needs to be seen with new eyes.

It's your work too

If you've come this far, maybe you've felt something. Perhaps an image has touched you, or a word has sparked a memory. This says a lot about you, rather than about me.

Art has this mysterious power to touch what is inside. It doesn't explain - it reveals. A work is more than an image. It's a mirror. When you get emotional in front of something I've created, you're actually recognizing yourself. And that's when the work stops being just mine and becomes yours too.

When creation becomes encounter

I remember a woman who, at the end of a rehearsal, said: “I've never felt so powerful.” It blew me away. Because it wasn't about beauty. It was about liberation. About seeing yourself with new eyes. About recognizing yourself.

That's why I keep creating. Because when I manage to provide a moment of genuine happiness for someone, I feel I'm fulfilling my purpose. There is no greater power than doing something positive for someone - with truth and love.

That's the force that drives me: turning listening into art, presence into an image, emotion into beauty.

The work continues

Some of the photographs accompanying this text are part of my first exhibition, in 2017. I was 36 years old - and there were 36 works, each representing a fragment of my journey so far. At the opening, I experienced something special: I let the public paint on me, turning my body into a canvas. A gesture of exchange, vulnerability and openness.

It was a way of saying that art is not just in what I create, but in what I share. That the aesthetic experience can also be collective. And that each person who allows themselves to feel becomes, in some way, a co-author.

My favorite work?

It will always be the next one. Because each new encounter carries the potential to reveal what has not yet been seen - and to heal what needs to be welcomed.

To create, for me, is to be alive. It's touching and being touched. It's transforming stories into images that, perhaps, can be a window into what is most beautiful in us.